Periferia Preta

Instituto Pacs
2 min readJul 26, 2019

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Por Saney Souza

Foto: Anette Alencar

A vida frente à democracia?

Estar viva hoje em dia não significa apenas que você fez boas escolhas ou andou do lado certo da vida. Por incrível que pareça, isso só não assegura.

De que lado está o racismo?

Lado esquerdo ou Lado direito?

Antes ou depois da ponte?

Quando criança eu ouvia minha mãe dizer que não era pra eu andar com determinada pessoa por que ela tinha costumes estranhos e isso poderia sobrecair sobre mim.

Hoje em dia, em territórios pretos, a lógica da vida frente às escolhas é questionável.

Quem escolhe ser morto?

Quem escolhe ser assassinada?

Diante desse atual modelo do desenvolvimento, a periferia, favela, comunidades ribeirinhas e das florestas são as regiões mais impactadas, caindo sob nosso corpo-território-sangue-dor.

Existem saídas para a não-dor?

Onde estão?

Pra quem estão?

Uma das práticas de bem viver sobressai no lugar onde eu moro em forma de plantios comunitários. O racismo ambiental é perverso e nossa resistência também vem de exercer nosso direito à cidade, a moradia, a soberania alimentar e o acesso à água através da prática política da agricultura urbana.

Através disso a leveza, tão ausente por aqui, se faz presente. Uma sensação de plenitude que nos invade preenchendo o coração. Pelo plantio e pela contemplação da natureza — o maciço — que nos circunda.

Será que existe alguma possibilidade da gente pensar na contemplação da natureza e o significado do solo preto frente ao chão que a mãe vê seu filho ensanguentado?

É solo. É chão. É terra.

Terra preta que enche de orgulho quem tá semeando alimento.

Terra preta que mãe vê o corpo do filho morto.

Que relação é essa que a gente cria com a terra?

Que relação a gente cria com a preta?

Mãe preta…terra preta. O que existe nessas reticências?

As percepções poderiam se alinhar? Ou seguem paralelas sem jamais se encontrar?

A cada momento que pratico plantios, ao tocar na terra, com a sensação de ahhhh (que todo mundo sente), sinto também uma dor.

Dor que não deveria sentir. Não nesse momento. Me pego inquieta…

Me abaixo pra plantar vida. Outras se abaixam pra chorar a perda de parte da sua vida

O chão não é outro. A mulher não é outra. É o mesmo solo de mãe preta…

O que dizem as reticências?

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